sexta-feira, 11 de outubro de 2024

Resplendor


Sem que soubéssemos
tudo era permeado de graça.
Nossas brincadeiras juvenis,
o contagiante êxtase da vitória,
a solidariedade árdua na derrota.
A infância em todo seu furor.
Tínhamos certeza de que tudo estaria bem.

Havia cumplicidade em nossos andares
mesmo quando invadíamos as ruínas do abatedouro
ou quando subíamos nos caminhôes e nos sujávamos de terra.
Pedalávamos muito mais longe do que podíamos.
Nossos carrinhos de rolimã invadiam velozes o trânsito.
O estrondo da pólvora era a raiz do sorriso.
Corríamos sempre sem camisas na chuva.
O mundo ainda era vasto e repleto de mistérios.

Hoje, velho, revisito as ruínas da infância.
A calçada onde escrevíamos nossos nomes.
A única parede que da casa amarela restou.
Os velhos muros que costumávamos pular.
O grande barranco em frente a cajazeira se apequenou.

Apenas os trilhos continuam os mesmos,
sempre paralelos ao rio,
sempre transportando minérios e mineiros.
Eu os observo do alto da estreita passarela
com a certeza de ter perdido algo inominável.

Eu nunca hei de voltar para as ruas que chamei de lar
quando eu era apenas Daniel do morro do  CESPE,
aluno do colégio Lafaiete,
neto de Maria Celeste
que a cidade inteira alfabetizou.
Eu hoje ando nos metros do Rio,
mas não sei para onde vou,
tampouco sei quem aqui sou.

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