A estática é tudo que ouço,
estações fora de sintonia,
portadoras esganiçando o sinal.
Com minha antena perscrutando o infinito,
nenhuma fagulha ou faísca pude encontrar.
Aonde estariam os mensageiros?
Carregam eles nossas preces para o abismo?
Eu também queria ouvir a música das esferas
ecoando doce por entre o périplo dos planetas.
O universo é tão indiferente
à nossas agruras torpes e pequenas.
Eu ainda estou aqui,
como a espuma desfazendo-se na praia,
como a areia cuja queda marca o tempo,
como o pêndulo cessando seu movimento,
como o vento encontrando sua casa
no grande corte na barriga da noite.
Eu presto muita atenção ao que o silêncio diz.
terça-feira, 10 de junho de 2025
מלאכים
segunda-feira, 9 de junho de 2025
δαίμων
Tu és por estrelas e signos designado,
um emissário de velhos deuses,
testemunhando o espírito tornar-se carne
e a carne em espírito refazer-se.
Sou mais velho do que me recordo,
prisioneiro dos incontáveis anos.
A roda gira uma vez mais.
Minhas feições mutáveis,
meus passos errantes.
Sou tão imperfeito quanto me permito ser,
mas tu és sempre eterno,
incorrompido pela geração.
Tu és o silêncio prenhe do possível
em que nada nunca há de acontecer.
Qual é a virtude de suas asas?
Qual o valor de suas palavra mudas?
Vigia-me como um carcereiro distante,
temendo que eu possa tocar-te,
temendo que possa eu um dia aprisionar-te
por entre as páginas do Livro dos Dias.
Eu estou aqui,
eternamente sob o jugo do olhar.
Perto demais para esquecer,
distante demais para tocar.
Mas sombras agora pendem largas
marchando contra o Sol e sobre mim.
Eu habito nos vales profundos,
mas eu não estou perdido.
Os ciclos nunca se encerram.
A vida não se abate.
Hei de deitar-me novamente.
Por quantas vezes hei de nascer e morrer
até que seus pés se dignifiquem
a tocar tão sagrado chão?
No céu distante,
todo os astros são perfeitos,
mas nesta terra ocre e dura,
todo homem e toda mulher são uma estrela.
quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025
Jonas
Ninive me conclama sem palavras ou gestos,
somente algum senso de dever e desejo
ardendo como uma chama alta demais,
brilhando como uma estrela fria.
Algo mais imaginado do que concreto.
Eu virei meu rosto para o gélido Oeste
pensando nele encontrar respostas,
mas só deparei-me com areias ermas
que trouxeram-me até o traiçoeiro mar.
Quase nada me restou.
Eu habito toda a extensão de minhas escolhas.
Tudo range e sibila no silêncio dessa nau,
Perseguindo bálsamos no poente,
Trajetórias e vistas demasiadamente claras,
mas tudo sempre se desfaz em vento e vagas.
Engolfado por uma escuridão líquida,
meus sensos se desvanecem dóceis.
Minha pele e meus pêlos molhados.
Sou nutrido e curado como uma criança do abismo
feita inteira na ausência de toda luz.
No terceiro dia eu também retornei,
tendo no silêncio encontrado minha palavra.
terça-feira, 28 de janeiro de 2025
Adyta
I was the seed within the apple.
From Pandora, the broken seal.
I am the hollowness of the amphora
longing for the boldness of the wine.
I am the voice that holds, in silence,
the fullness of all mornings.
I am no longer sufficient or necessary.
I was scattered in every corner,
I am everywhere,
perhaps in fragments,
but ripe now,
better.
Made of jagged, rounded pieces,
like a stone that's tumbled a river’s length,
like a mountain ground to sand.
I know the heavens also dwell beneath my feet.
I am the tattered, translucent cloth
tied to the barbed wire of days,
thrashing against the wind,
an invisible, unbound fury.
segunda-feira, 13 de janeiro de 2025
Áditos
De Pandora, o violado fecho.
Eu sou o vazio da ânfora
clamando pelo brio do vinho.
A voz que sustenta no silêncio
toda a inteireza das manhãs.
Eu não me basto mais.
Estou em todos os cantos,
Eu estou em todos os lugares,
Em pedaços talvez,
mas maduro,
melhor.
Feito de peças e partes rombudas
como a pedra que rolou toda dimensão do rio,
Como a montanha que puiu-se em areia.
Eu sei que os céus também estão no chão.
Sou o roto e translúcido trapo
amarrado contra o arame farpado dos dias,
debatendo-me violentamente com o vento,
fúria invisível e liberta.