segunda-feira, 1 de julho de 2024

Amputações

 

É preciso preservar o todo,
aceder à realidade do dano
e entender que a cura
perpassa alguma dissolução
de tecido outrora saudável.

As fibras romper-se-ão doidamente,
os tendões irão ao fim se rasgar.
Os ossos serão devidamente serrados.
Não foi possível proteger
a coesão típica dos corpos.

O rearranjo expõe os nervos,
sensibiliza-nos ao toque,
coroando a pungente falta
e alguma noção perdida de inteireza
nos o palcos e palácios
de nossas resignadas emoções.

É preciso abrir espaço para o novo
e aceitar que algo importante
foi-nos definitivamente tomado.

Sobram-me cada vez menos partes e pedaços
de algo que posso considerar eu.

Embalado por algum láudano ou éter,
rearranjo as peças
sem mais me reconhecer
entre novos retalhos e cicatrizes.

Tomaram-me todos os dedos
e tudo que tenho são anéis.

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