terça-feira, 10 de junho de 2025

מלאכים


A estática é tudo que ouço,
estações fora de sintonia,
portadoras esganiçando o sinal.
Com minha antena perscrutando o infinito,
nenhuma fagulha ou faísca pude encontrar.

Aonde estariam os mensageiros?
Carregam eles nossas preces para o abismo?
Eu também queria ouvir a música das esferas
ecoando doce por entre o périplo dos planetas.
O universo é tão indiferente
à nossas agruras torpes e pequenas.

Eu ainda estou aqui,
como a espuma desfazendo-se na praia,
como a areia cuja queda marca o tempo,
como o pêndulo cessando seu movimento,
como o vento encontrando sua casa
no grande corte na barriga da noite.

Eu presto muita atenção ao que o silêncio diz.

segunda-feira, 9 de junho de 2025

δαίμων



Tu és por estrelas e signos designado,
um emissário de velhos deuses,
testemunhando o espírito tornar-se carne
e a carne em espírito refazer-se.
Sou mais velho do que me recordo,
prisioneiro dos incontáveis anos.
A roda gira uma vez mais.

Minhas feições mutáveis,
meus passos errantes.
Sou tão imperfeito quanto me permito ser,
mas tu és sempre eterno,
incorrompido pela geração.
Tu és o silêncio prenhe do possível
em que nada nunca há de acontecer.

Qual é a virtude de suas asas?
Qual o valor de suas palavra mudas?
Vigia-me como um carcereiro distante,
temendo que eu possa tocar-te,
temendo que possa eu um dia aprisionar-te
por entre as páginas do Livro dos Dias.

Eu estou aqui,
eternamente sob o jugo do olhar.
Perto demais para esquecer,
distante demais para tocar.

Mas sombras agora pendem largas
marchando contra o Sol e sobre mim.
Eu habito nos vales profundos,
mas eu não estou perdido.
Os ciclos nunca se encerram.
A vida não se abate.
Hei de deitar-me novamente.

Por quantas vezes hei de nascer e morrer
até que seus pés se dignifiquem
a tocar tão sagrado chão?

No céu distante,
todo os astros são perfeitos,
mas nesta terra ocre e dura,
todo homem e toda mulher são uma estrela.