Eu olho no espelho
E não tem ninguém do outro lado.
Sinto o frio toque do vidro
E não pairo mais aqui.
Sou o semáforo danificado
Iluminando em vermelho e verde simultâneos
A confusão aguerrida dos motoristas.
Sou a moeda desvalorizada
Reluzindo como estrela na sarjeta
Sem alguém que me estenda a mão
E traga-me para o aconchego de um bolso.
Sou a porta dos elevadores
Em eterno descompasso
Com nossos quereres, horários e amores.
Eu existo nos entre-espaços e interstícios
Para pontuar o silêncio com minha presença
Incômoda, desengonçada.
Eu agora vejo a comédia
Em um dia ter desejado ser
Algo mais profundo do que sou,
Como uma criança
A brincar com sapatos 46,
Mas eu sou também o espaço sucinto
Separando os pés do indelével salto.
Sou a página que já foi virada
Ostentando rabiscos sem significação,
Um poema talvez.
Mesmo perdido entre anos e gavetas,
Existem coisas belas por aqui.
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